Migrante, nômade, palhaça, bonequeira e cicloviajante. É desta forma que a artista venezuelana Julieta Inés Hernández Martínez se definia nas redes sociais. A artista, de 38 anos, chegou ao Brasil em 2015. Ela compartilhava registros de suas viagens e um pouco do seu trabalho como palhaça.
E no fim do ano passado, ela decidiu ir de bicicleta do Rio a Venezuela, onde iria reencontrar sua mãe.
De acordo com as investigações, por não encontrar outras hospedagens disponíveis na região do município de Presidente Figueiredo, a 117 quilômetros de Manaus, Julieta foi passar a noite de 23 de dezembro numa casa onde um casal, Thiago Agles da Silva, 32, e Deliomara dos Anjos Santos, 29, vivia de favor com cinco filhos. O crime ocorreu naquela mesma noite. Thiago rendeu a vítima com uma faca para pegar o celular dela antes de entrar em luta corporal com a artista e amarrar seus pés e suas mãos. Ele a arrastou para dentro da casa e abusou sexualmente de Julieta.
Com ciúme do marido, Deliomara jogou álcool na dupla e ateou fogo neles. O homem apagou as chamas no quintal, deu um mata-leão na vítima e foi para o hospital local tratar as queimaduras. Enquanto isso, Deliomara arrastou a venezuelana pelo quintal da casa e a enterrou numa cova rasa. Durante as agressões, Julieta ficou desacordada mais de uma vez.
Em entrevista coletiva, o secretário de Segurança Pública do estado, Vinicius Almeida, afirmou que os investigadores não descartam que a artista ainda estivesse viva quando foi colocada na cova.
— Há possibilidade, sim [de Julieta ter sido enterrada ainda com vida], uma vez que, segundo o que a Deliomara falou, o Thiago apagou a vítima algumas vezes. Ele fez isso no momento em que foi tomar o celular e lá dentro da residência outras vezes, após o momento que Deliomara pôs fogo nela — disse.
O corpo foi encontrado enterrado, na sexta-feira, em uma área de mata do município de Presidente Figueiredo, a 117 quilômetros de Manaus. Mais tarde, foi identificado como sendo da artista venezuelana, que estava desaparecida desde o dia 23 de dezembro.
A Polícia Civil do Amazonas recuperou essa semana a bicicleta, roupas e violão da artista. Thiago Agles da Silva e Deliomara dos Anjos Santos, que estão presos desde sábado, foram indiciados por latrocínio (roubo seguido de morte), estupro e ocultação de cadáver.
Segundo o delegado Valdinei Silva, titular da 37ª Delegacia Interativa de Polícia (DIP) de Presidente Figueiredo (a 117 quilômetros de Manaus),, os pertences serão entregues a amigos de Julieta em Manaus, que levarão à família da artista na Venezuela. No violão localizados pelos agentes há o nome de Julieta gravado em uma etiqueta do Rio de Janeiro. Artista de circo, ela atravessava o Brasil de bicicleta.
Enterro acontece nesta sexta
Amigos, familiares e admiradores de Julieta Hernández deram, nesta quarta-feira (10), o último adeus para a artista venezuelana, em Manaus. O corpo da criadora da palhaça Jujuba, vítima de um feminicídio, foi velado na zona Centro-Sul da capital amazonense. O enterro vai acontecer nesta sexta-feira (12), na Venezuela.
Abalada, a mãe de Julieta, identificada apenas como Júlia, chegou ao local sem falar com a imprensa. Ela permaneceu dentro da capela para recepcionar quem foi prestar homenagens a artista.
Coletivos de artistas, em especial grupos de palhaços, estiveram presentes. Como forma de homenagear Julieta, todos foram caracterizados com seus personagens circenses.
A bicicleta usada pela palhaça venezuelana para viajar pelo Brasil se tornou um símbolo da presença dela durante a despedida. Ao lado do caixão, os pneus deram lugar a uma ornamentação de flores com pétalas de rosas, enquanto fitas coloridas decoraram outras partes da bike.
A imprensa foi impedida de entrar na capela e os familiares, assim como amigos íntimos, optaram pelo silêncio. O secretário executivo da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Amazonas, Kaká Bonates, explicou que estavam todos em luto e que, por isso, o Estado preparou um grupo de apoio que esteve no velório.
Homenagens
Na segunda-feira (08), o governo da Venezuela, através do Ministério do Poder Popular para a Cultura, destacou a trajetória de Julieta para a arte do país vizinho do Brasil. Em um comunicado, classificou a artista como ‘uma verdadeira embaixadora da paz em nossa América’
“Julieta foi uma verdadeira embaixadora da paz em Nossa América. No Brasil, desenvolveu intensos contatos com movimentos sociais daquela nação irmã sul-americana, mantendo sempre em alta sua pregação feminista, seu amor pela infância, pelos animais, pelo direito ao sorriso e pela Venezuela Bolivariana. […] O Governo Bolivariano e a comunidade artística venezuelana agradecem ao povo irmão brasileiro e à sua liderança social pelas manifestações e mobilizações realizadas a partir do momento em que Julieta desapareceu com sua bicicleta inseparável. Nem mais um! Honra e glória eterna a Julieta Hernández!”, disse em comunicado.
FONTE: Painel Politico.