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ARTHUR LIRA É ACUSADO DE ESTUPRO – ‘Me esganava e perguntava: ‘Tá, vadia?’, diz ex que acusa Lira de estupro

ARTHUR LIRA É ACUSADO DE ESTUPRO – ‘Me esganava e perguntava: ‘Tá, vadia?’, diz ex que acusa Lira de estupro

“Tive o entendimento há uns três ou quatro anos, vendo reportagens e divulgações na internet sobre o assunto. Me senti enojada, suja, horrível”, diz.

O deputado federal Arthur Lira (PP-AL), atual presidente da Câmara dos Deputados, e Jullyene Lins viveram um relacionamento por dez anos, desde 1996. No dia 5 de novembro de 2006, seis meses após terem se separado, Jullyene diz ter sido agredida e estuprada pelo parlamentar depois de ele saber que ela estaria se encontrando com um homem. “Ele dizia: ‘Sua puta, sua rapariga, você quer me desmoralizar?’, enquanto puxava meu cabelo e me batia. Quando me deu uma rasteira, eu caí, e ele começou a me chutar” contou Jullyene, 48, a Universa, repetindo o depoimento dado à polícia de Alagoas há 17 anos e que consta no boletim de ocorrência, registrado no dia da agressão relatada e ao qual a reportagem teve acesso.

Universa também teve acesso ao processo que ela moveu na Justiça alagoana contra Lira por violência doméstica, aos depoimentos de quatro testemunhas e ao laudo médico que atestou hematomas nas pernas e nos braços. O caso se estendeu até 2015, quando Lira já era deputado federal e deveria ser julgado pelo STF (Supremo Tribunal Federal). Foi absolvido após Jullyenne mudar seu depoimento. Hoje, ela diz que foi ameaçada por ele: se não retirasse a queixa, perderia a guarda dos dois, atualmente com 17 e 23 anos.
A reportagem procurou o deputado Arthur Lira e pediu uma entrevista, assim como a que foi feita com Jullyenne. Por meio de sua assessoria de imprensa, informou que “não está respondendo a qualquer veículo sobre esse assunto de ordem familiar”. Mesmo após insistência e envio de perguntas e das declarações de Jullyene que seriam publicadas, a resposta foi de que, por decisão dele e de seus advogados, não haveria manifestação.
No boletim de ocorrência, Jullyene disse que foi ameaçada de morte. Consta no documento que ele batia nela “dizendo que ia matá-la para ficar com os filhos”. O caso ocorreu após ele ter tido “ciúme por a mesma estar almoçando com outra pessoa”, ainda segundo o B.O.
Em janeiro de 2021, quando Lira era candidato à presidência da Câmara, Jullyenne revelou as agressões ao jornal “Folha de S.Paulo”. Em junho deste ano, em uma entrevista para a Agência Pública, Jullyene falou pela primeira vez sobre a violência sexual que diz ter sofrido naquele mesmo dia. O relato foi confirmado a Universa e complementado com a informação de que ela demorou para entender que havia sofrido um estupro.
“Tive o entendimento há uns três ou quatro anos, vendo reportagens e divulgações na internet sobre o assunto. Me senti enojada, suja, horrível”, diz.
 
“Abri a porta e ele já me deu um soco”.

Segundo Jullyenne, o presidente da Câmara telefonou para ela e questionou o fato de ela estar em um barzinho, falando que ia até sua casa para que eles conversassem pessoalmente. “Quando abri a porta, ele já me deu um soco. Começou a me chutar. Foi muito humilhante”, conta. A violência, segundo ela, escalonou. Arthur Lira teria empurrado ela contra a parede, a esganado e dito: “Você está procurando homem? Não quer homem? Tá, vadia? Tá atrás de homem pra fu***?”. Nesse momento, diz, foi violentada. “Ele ficou por cima de mim. Eu esperneava, gritava, pedia socorro, enfim. Ele fez o ato e eu não consegui me desvencilhar. Só escapei no momento em que ele foi se arrumar. Mas já estava muito machucada. Corri para a cozinha. Vi a babá do meu filho e pedi para ligar para minha mãe. Mas ele me puxou pelo braço e continuou as agressões”, relata. Ela afirma que era agredida com tapas também na hora da violência sexual.

A mãe e o irmão de Jullyene foram até sua casa. “Minha mãe o tirou de cima de mim”, conta.
O relato da babá à polícia confirma a versão de Jullyene, assim como os do irmão e da mãe dela, que dizem tê-la encontrado caída no chão.
Medo de denunciar estupro
Ao chegar à delegacia, em Maceió, Jullyene diz ter “travado”. “Era um lugar cheio de homens, eu ia falar de uma pessoa conhecida, que era deputado estadual”, diz, referindo-se ao cargo que Lira ocupava na Assembleia Legislativa de Alagoas. “Eu ia falar que tinha sido violentada sexualmente e me responderiam: ‘Mas ele é seu marido. Qual o problema?'”, conta. No depoimento dado à Justiça, Jullyene diz que ouviu de Arthur Lira outra ameaça: “Onde não há corpo, não há crime.”
No laudo do exame de corpo de delito realizado em Jullyene, ao qual Universa teve acesso, os peritos atestaram que houve “ofensa à integridade corporal e à saúde da paciente”. Ela apresentava hematomas nas seguintes regiões: lombar, glúteo, rosto, coxas, antebraços e parte posterior das pernas.
“Tornou-se evidente personalidade violenta do réu”
Arthur Lira foi intimado duas vezes a prestar depoimento sobre a denúncia, mas não compareceu à 1ª Delegacia Especializada de Defesa dos Direitos das Mulheres, de acordo com documento assinado pela titular, Fabiana Leão Ferreira.
O desembargador Orlando Monteiro Cavalcanti Manso relatou no processo o desprezo de Lira pela justiça de Alagoas. Em declaração, disse que um oficial de Justiça ouviu do político: “Eu recebo já essa merda”, ao tentar lhe entregar uma intimação. Arthur Lira chegou a ser afastado de suas funções como deputado após esse comportamento e, apesar de Manso ter dado voz de prisão por coação do curso do processo, não houve punição.
O magistrado disse, ainda, que no curso do processo, “tornou-se clarividente a personalidade violenta do réu, não só com sua ex-esposa”.
Manso não julgou o caso. Em 2011, quando Lira assumiu seu primeiro mandato como deputado federal, o processo foi transferido para o STF.
Julgado e absolvido em 2015
Arthur Lira foi julgado e absolvido em 2015, nove anos após a denúncia, quando já estava exercendo seu segundo mandato na Câmara dos Deputados. A decisão coube ao STF —o placar da votação foi de 5 a 3. Tanto Jullyene quanto seus familiares e a babá mudaram seus depoimentos no processo. Ela detalha o motivo:
“Ele foi à minha casa, me ameaçou. Não sei nem como conseguiu entrar no condomínio. Bateu na mesa e eu até assustei. Perguntei o que estava fazendo ali, e ele falou que eu ia mudar meu depoimento, falar que me enganei, que estava medicada, alguma coisa, ou iria tirar meus filhos de mim”, conta Jullyene.
A reportagem questionou a equipe do deputado sobre essa acusação especificamente, mas não houve resposta.
“Ele dizia: ‘Vou tirar os meninos de você e vou acabar com a sua vida. E você vai me pagar se não fizer isso. Acabo com a sua vida. Dentro de Alagoas, do Brasil, você não vai ser ninguém’. Jullyene conta que ficou com medo e pediu à mãe, ao irmão e à babá que também mudassem o depoimento.
“Sou responsável por isso e não me isento da minha culpa.” Hoje, ela não tem mais contato com os filhos e chora ao falar deles.
Novo processo
Jullyene não sabe se vai abrir outro processo contra Arthur Lira por violência sexual. “Tenho que falar com meus advogados. Eles estão vendo como podemos proceder, porque ele já foi inocentado. Então não sei se ainda dá ou se vai valer a pena”, disse a Universa.
Questionada sobre por que voltar a falar sobre o que viveu, ela diz que tomou a decisão “para encorajar outras mulheres” a denunciarem.
 
Como denunciar violência doméstica
Se você está sofrendo violência doméstica, seja ela física ou psicológica, ou conhece alguém que esteja passando por isso, pode ligar para o número 180, a Central de Atendimento à Mulher. Funciona em todo o país e no exterior, 24 horas por dia. A ligação é gratuita. O serviço recebe denúncias, dá orientação de especialistas e faz encaminhamento para serviços de proteção e auxílio psicológico. O contato também pode ser feito pelo Whatsapp no número (61) 9610-0180.
Para denunciar formalmente, procure a delegacia próxima de sua casa ou então faça o boletim de ocorrência eletrônico, pela internet.
Outra sugestão, caso tenha receio em procurar as autoridades policiais, é ir até um Cras (Centro de Referência de Assistência Social) ou Creas (Centro de Referência Especializado de Assistência Social) da sua cidade. Em alguns deles, há núcleos específicos para identificar que tipo de ajuda a mulher agredida pelo marido precisa, se é psicológica ou financeira, por exemplo, e dar o encaminhamento necessário.

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